Eu vejo a pobreza de perto. Todos os dias. Ela chega de manhã, toma leite com pão, fica ao meu lado e depois vai embora. Sabe-se lá pra onde. De certo algum barraco de emendas de papelão e restos de madeira e um só colchão para dividir com outros irmãos a espera.
A pobreza chega feliz de chinelos velhos e sujos. Entra sorrindo, me cumprimenta com um beijo. Me abraça como se encontrasse algum conforto e fica alí até esquentar o corpo frio, de quem não tem agasalho.
Me causa certa indignação o fato d'ela não reclamar e nunca se revoltar porque a vida vai mal. Ao contrário, ela sabe que sorrir pode ajudá-la a não se lembrar de como a realidade é dura.
Outro dia, encontrou R$0,05 centavos no fundo da mochila. Me contou, toda feliz, como se tivesse encontrado um tesouro. De fato, era dinheiro suficiente pra comprar uma bala e adoçar a vida tão amarga. Mas os dias andam difíceis para a pobreza. Ela prefere juntar cada moedinha que encontra para, no final, comprar um saco de farinha, porque no velho barraco "não tem muita coisa pra comer".
Senti vergonha de mim mesma e das minhas mais íntimas futilidades. A pobreza me faz engolir seco. Me faz refletir como preciso ser mais humana e menos egocêntrica. Me faz olhar menos pro umbigo e mais para os lados.
Certa vez alguém comentou comigo que, quando era criança, perguntou para um mendigo: "ser pobre dói?!". Dói. Dói mais que saudade, dói mais que encostar o dedo na panela quente, dói mais que pisar no caco de vidro. Dói por dentro. É a dor da falta de esperança.
A pobreza se chama Jeniffer, com dois f's, como ela sempre gosta de ressaltar.